imagem daqui |
Gerúndio
Somos um povo de gerúndios. O
gerúndio é um tempo verbal que indica uma
ação em andamento, um processo verbal não finalizado. Quando
perguntamos a alguém como é que vai, a grande probabilidade é que nos respondam
«vou andando», em vez de simplesmente dizerem «bem» ou «mal». Como os
problemas são para «ir resolvendo», as «coisas» para se «ir fazendo», as
dívidas para «ir pagando», as crianças para «ir crescendo» ou «estudando». O
gerúndio traduz bem a nossa forma de sentir e de agir. Gostamos desta fórmula
gramatical que nos permite arrastar as situações e os estados de alma no
tempo. Temos dificuldade em ser diretos, assertivos, de «pegar o touro pelos
cornos». Tentamos contemporizar, evitamos comprometer-nos, queremos sempre
um meio-termo, procuramos as zonas cinzentas em vez de optarmos pelas pretas
ou brancas. Somos assim, é verdade, e o gerúndio está-nos tão entranhado nos
genes que provavelmente nem nos ocorre ser/dizer de outra maneira. Mas há alturas
- como esta - em que temos mesmo de conjugar os verbos nos seus modos mais
perfeitos. Como o presente e o futuro do indicativo. Não há espaço para condicionais
ou conjuntivos, sob pena de ficarmos presos nos pretéritos (passados). Os
países que queremos ser não podem ser conjugado no gerúndio.
Sofia Barrocas, in
Notícias Magazine, 30.10.11
Sem comentários:
Enviar um comentário